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Ramón Freixa Madrid, menu temporalidad 12/22
Ramón Freixa Madrid, menu temporalidad 12/22

Ramón Freixa Madrid, menu temporalidad 12/22

Por aqui desfrutamos a gula, desfrutamos voltar, e inclusive desfrutamos voltar por gula.

Essa última viagem a Madrid foi repleta de lembranças. Caminhar por ruas já percorridas, visitar lugares já conhecidos, olhar com novos olhos essa cidade onde uma vez vivi, senti e experimentei demais. Assim como comer uma porção muito grande de torta adormece o paladar, viver tantas coisas em um curto espaço de tempo confunde a memória.

“Al lugar donde has sido feliz no debieras tratar de volver”, cantou Sabina. Voltar oferece um risco: que as coisas já não sejam como antes. Talvez porque realmente mudaram, ou porque cada lembrança sempre traz consigo um toque de idealização. Contrariando a Sabina, eu aceito esse risco: volto a países, volto a cidades e volto a restaurantes.

Ramón Freixa foi o primeiro restaurante com estrelas Michelin ao que fui, em 2018. Minha memória dizia: “você amou”. Claro que amei, vejo programas de gastronomia desde os 15 anos, e com menos de 10 já andava pela horta mordiscando de tudo. Mas, o que comi? Uma mistura confusa de sensações e sabores, onde o prato principal foi “Caraca! Estou comendo em um Michelin!”.

ramon freixa madrid

Quatro anos depois, volto para constatar que Freixa apresenta a Espanha com elegância e agilidade. Da terra ao mar, das histórias familiares a novos discursos. Nesse movimento, sabores da sua infância como o palulú chegam à mesa trazendo não a sensação de mastigar a madeira em busca de um paladar doce, mas sim a complexidade do foie gras e cogumelos. O vermut deixa de ser um drink para converter-se em um bombom levemente alcoólico e salgado, e os pães de seu pai aparecem como uma pausa necessária em homenagem à herança familiar.

ramon freixa madrid

Entre os pratos, fiquei apaixonada pelo coral de cogumelos; mix de cogumelos crocantes, com um duo de molhos mar x terra. Havia pedido uma taça de Pinot Noir da Borgonha (incrível vinho) e estava esperando a hora certa de tomá-lo. Foi esse o momento. O prato principal (lomo de gamo com molho de frutas vermelhas e brioche ao whisky) concluiu na hora certa um menu que vinha subindo em intensidade, tanto que a sobremesa e os chocolates foram por pura gula. Problema zero. Por aqui desfrutamos a gula, desfrutamos voltar, e inclusive desfrutamos voltar por gula.

Micaela Redondo